domingo, 28 de fevereiro de 2010

Resposta sem perguntas


(foto de José Antunes)


Existem palavras
Que buscam o sol
Nos beirais dos telhados a descoberto
Ao longo das goteiras
Que a chuva lava e reclama

Olhamos para elas
Em busca do segredo
Para lá das moradas escritas…

Um solitário gesto
Na distância das arestas
Que nos é facultado espreitar

Diálogos mudos
Nos ouvidos com vínculos de emoção
Contactos que tantas vezes
Nos ignoram…

Respostas na sombra
Do desconhecimento que move
O universo por escrever…

Terá a palavra beleza?
Ou a beleza é a utopia da palavra?

A leitura um ciclo aberto ao imaginário
Quando o mundo
Sorri em gumes
De uma lágrima escrita…
E chora no silêncio
De um sorriso coberto de alegria…

Se Poeta És (para ROMMA)


Esperar é um tempo morto
dar é um tempo que aviva a memória
dos que nada têm

Avistar o horizonte
e querer ver o mundo do além
é saber-se eterno
doado á terra de ninguém

Trespassar o véu e cair no céu
é ver o mundo sobre um olhar novo
sorrisos que o rosto contém

Cair no vácuo
essa dor(mente) queda abrupta
que é sair-se de órbita
e ser-se um mero sinal no espaço

São pontos minúsculos
levados pelos ventos tardios
e se poeta és num mar de Abril
serás um jardim à beira-mar plantado
e serão rosas, cravos, e aromas de jasmins
e alguns sorrisos de almas
que já foram de todos os jardins

Inspirado neste outro de ROMMA:
(foto Dolores Marques)

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Sei lá gritado!

.
Esqueci de ti
sei lá porquê!
Ocupei meu corpo
e à mente
arremessei-lhe, teatro
ontem fui papel feliz
num sorriso
alongado até hoje
lembrei ao sentir
saudades sabes,
senti saudades!
Sei lá
se me ouves!
Nesta volta
vi que a tudo
escapei
lembrei, ouviste?
Lembrei
e cá voltei!
Aqui tens a pegada
da minha ausência

e uma mão cheia de nada num um olhar,
distante.
Estou assim, quase perdida no sorriso de um palhaço!
Sei lá se volto! Sei lá se vou! Já não sei o que sou!
Ouço, ouço o actor cá dentro e dizem que é mentecapto
dessa louquice eu gosto, não, é pouco!
Adoro e amo ser mentecapto! Adoro ser louco
Adoro gritar o mesmo nome:

Sei lá! Sei lá! Sei lá! Gritei, e pronto!
.

Impulso Inicial





Partiste.
No prenúncio do tempo,
Em tempos ainda sem tempo.

Nefanda explosão original.
Sem ti,
Sou só Imortal.



Vagueei por profundos espaços,
Espaço sem fim.
Expandi o Universo em infinitas fracções.
Apenas para te encontrar.


Só em teu fragmento Sou.


Nefasta implosão original.
Mundos sem mundo,
...(onde me perdi).
No início do tempo,
...(eterno, sem ti).


Passo descalço no rasto do sonho,
Matéria negra é pranto incontido.
As estrelas são lágrimas cristalizadas,
Reflexos-luz de galáxias geladas.

Traços de sóis extintos,
Paralelo é o movimento de nossas partículas.



A existência é parâmetro variável.
Composto.
Decomposto.
Num nebuloso sistema.

Na via do entendimento,
Espesso é o espaço-tempo.
Verdade curva da nossa relatividade.


Perdi no tempo o tempo.
Suspendi o contar das Eras,
Sem horas.


Determino o recomeço.
Nosso novo começo.

Renuncio à perpetuidade.
Na memória serei imortal.
Renascer em corpo,
O impulso inicial.


(Este é o último dia antes de mim)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Sonhei ser lágrima

Esculpi em mim
numa só camada de dor,
a lágrima que sonhei ser,
na terra fértil,
dum só rio único
descendo na intimidade
da raiz que cresce.

Improvisei os contornos
com traços de cimento,
à distância dum tempo
concedo a existência
ao inconcreto real
daquilo que sou!
…e todo o corpo liquido
são ossos da língua
que o sonho sustenta
em ruínas de asfalto
…onde o sangue chora
submerso no vazio diário!...

E sou fragor de mim
nas horas que se perdem,
em rios de Outono
como murmúrios amargos
na ausência da razão…

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

" Arfemo"

A seara está madura

os frutos prontos

a ser colhidos

nas mãos

da amizade

a ternura

dos amigos

que se deram.

I

Do olhar de uma

mulher

a luz que os homens

negaram

no corpo da musa

cibelle

o renascimento

do amor almejado.

II

Mas é na hora

da partida

que o amor

mais se sente

da poesia

e do poeta

que marca

a alma

da gente.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Solilóquio


Por onde andarão as palavras certas
Que os versos enchiam em graça e contento?

Estão como palhas jogadas ao vento,
Perdidas no limbo das horas incertas.

Por onde andarão inebriantes musas
Que nuas dançavam em meus pensamentos?

Estão apartadas em claustro convento,
Nos ocos segundos das horas exclusas.

Se o tempo se impõe exato, irredutível;
Se os sonhos se perdem ou ficam pela estrada,
Eu deixo o silêncio completar-me lento?

Esqueça o futuro cego, imprevisível;
Afasta o passado coxo da jornada;
Entrega-te ao Todo e viva o momento.


Frederico Salvo

Noite de lua cheia

A luz apaga-se.
Na metamorfose
uivam os lobisomens

Nas rimas a baba
nas garras o poema

parido e sem pele - O poeta

José Luís Lopes

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Um dia vou dar-lhe um título

Goya - Homem carregando fardo

Hoje virei o retrato contra a parede

Tirei-lhe o futuro

Abafei-o no seu próprio passado

(continua)
José Luís Lopes

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Por dentro de fora




dançar e sorrir
o quanto quisermos
estar por aí sózinho
sentir minha aquiecência
provocar um tiroteio
ganhar a aposta
nariz colado na vitrine
trocar as cortinas
ficar desconfiado
correr ente os canavias
reeencontrar um livro
sapatos macios
sol se pondo na hora
escrever no caderno dos outros
um olhaar por dentro de fora
vestir só as botas
ter bolsos metafóricos
trazer uma navalha afiada na lingua
apertar a mão da vida
nas últimas contrações
deixar o silencio sem nome

Vania Lopez

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

sonho-te

.
Sempre
que fecho meus olhos
é minha ânsia
ver-te de novo
e sonho contigo
como se passasses
o tempo aqui
junto a mim
sofro o teu cheiro
persisto teu corpo
e aquele calor terno
do teu abraço
bem demorado
provo o doce
do teu beijo lento
e cuido
ai como eu cuido
meu Deus!
Não sonhar à correr
para não pensar
à correr
que neste sonho
tu advéns
para não me acordar
nem desejo mais
abrir meus olhos
não quero
tenho medo
medo de te ver quebrar
outra vez
numa partida
para longe de mim
és minha alegria
és minha ciência
vives comigo
nesta fantasia
nem que seja
só e apenas
num sonho por magia
do meu sonho
que sonhes comigo 
no mesmo defeito
.
em memória de um grande amor
.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

a vida é tão estúpida que nem a própria estupidez a reconhece...


Tropecei nos silêncios de pedras calcinadas defronte a uma esquina de vidro, ao longe a coluna dorsal do mar dobrava-se em delicadas vértebras, lambendo as sequelas enraizadas de salitre na “Vesperata” onde a luz e as sombras se encontram.
Quis sentir-lhes o sabor…saboreei o primeiro trago na inocência a ilusão, o segundo o despotismo enfadava a razão, o terceiro trago servia para sustentar qualquer condição.
A vida é tão estúpida que estupidez alguma a reconhece quando no lamaçal a morte se finge acordada.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Flamejo de Poeta

Sou poeta
ignoro factos
que em nada me alteram

Planejo meu céu
voo sem tempo de voltar
porque um ser perfeito
não tem hora que volte

Se a vida é dura
não sou menor que ela
e se subo oportunidades
não me prendo ao nada
sem deixar-me a perder
pelos recantos que trago

Meu lugar
está escrito nas estrelas
onde brilho
se na montanha
me encontrar de novo
onde cresço
escalo o universo
como centro do mesmo tempo
onde vagueio e me solto
porque tempo não volta

A alma de poeta
vive eternamente
sem esperar flores
nem amores que vacilam
pela minha nostalgia
.