domingo, 20 de março de 2011

chão de lantejoulas



te arranhei com as palavras

as que guardei

as horas foram sumindo

nas asas de uma música lenta



sentados no silencio de nós

uma caipirinha estendida no copo

a alma ansiando por um jardim

que comporta se teu perfume

o salto doía

tropeçando no teu nome




espalhei os lábios

na mesma palavra

queria usar o deslumbramento

dos seus quadris pintados

em confissões de corredor



queria te guardar

como sorriso no retrovisor

como vermelho no meio de tudo

queria me cobrir com sua pele

(te deixando sem corpo)



foi maior que o salão

foi mais que um cigarro

molhei as pedras lisas

com água florida

para rever as borboletas

que inconscientemente descansam

entre seu peito e cintura

entre o perdido e o que virá



(descansar as mulheres em mim assoviando)




Vania Lopez

terça-feira, 15 de março de 2011

Cenas das portas



meu bem saiu

o barulho dos passos

corre nas pessoas

(no corpo e na cabeça)



deixo aqui um bilhete e uma planta

que rego desde que te conheci

e um chá quente esperando por você

vou manter a poesia acesa

e o portão cerrado

nessa saudade interminável



vou me refugiar no batom

calar teu nome

na porta da frente



não vou te amar

do jeito que quer que eu te ame

(vou estar com frio... pegando fogo)

 
Vania Lopez

quarta-feira, 9 de março de 2011

Não há que se dizer mais nada


O fogo que há em ti
É o mesmo que me queima.
Em mim pode agitar a alma
E atormentar os pensamentos
Em ti pode ser apenas
Uma branda chama apática.
Pode ser que em ti
Não consiga aquecer a melancolia
E nem iluminar-te os olhos,
E em mim seja calor eufórico
A brasa da minha língua,
Mas será sempre o mesmo fogo.
O mesmo que na natureza
Vai adubar a terra
Onde então a semente
Estabelecerá sua morada.

A terra que há em ti
É também a mesma que me firma.
Em mim pode ser ressequida
E devorar qualquer umidade.
Em ti pode ser fecunda
Casa de todo verde.
Pode ser que em ti
Seja estrada que encaminhe
E te encha de viço os lábios,
E em mim seja apenas deserto
A sede na minha boca,
Mas será sempre a mesma terra.
A mesma que na natureza
Vai abrigar a pedra
Onde a água cristalina
Brotará como encantada.

A pedra que há em ti
É a mesma em que me assento.
Em mim pode ser início
A base da fortaleza.
Em ti pode ser estorvo,
Lápide indesejada.
Pode ser que em ti
Seja peso sobre os ombros
Ou lhe feche as narinas,
E em mim seja solo seguro
Onde não se conhece a tristeza.
Mas será sempre a mesma pedra.
A mesma que na natureza
No âmago da sua dureza
É berço de toda água.

A água que há em ti
É a mesma que me sacia.
Em mim pode ser escassa
A fonte de todo medo.
Em ti pode ser que farte
Dádiva pura e sagrada.
Pode ser que em ti
Seja rio caudaloso
Ou mar de completa abundância,
E em mim seja ínfima gota
Inexpressiva em meu deserto.
Mas será sempre a mesma água.
A mesma que na natureza
Vai hidratar a semente
Da árvore tão esperada.

A árvore que há em mim
É a mesma que em ti aflora.
Em mim pode ser frondosa
Sombra ao meio-dia.
Em ti pode ser esquálida,
Frágil, mero caniço.
Pode ser que em ti
Seja baixa e retorcida
Ou cacto de pura ira
E em mim seja forte e frutífera
Esteio da minha rede.
Mas será sempre a mesma árvore.
A mesma que na natureza
É mais suscetível ao fogo
Quanto mais é ressecada.

E agora, se me permite,
Não há que se dizer mais nada.
Basta só entender que a vida,
Em nuances repartida,
Nunca foi fragmentada.



Frederico Salvo